‘Um poder não pode ser subordinado ao outro’, afirma Tieza

‘Um poder não pode ser subordinado ao outro’, afirma Tieza

17/12/2018 0 Por Tieza Vereadora

Entrevista ao repórter Ronaldo Ruiz Galdino publicada na edição de 16/12/2018 do jornal Folha da Região. Foto de  Carolina Marques

    

Para a presidente eleita da Câmara de Araçatuba para o próximo biênio (2019-20), Tieza Marques de Oliveira (PSDB), o relacionamento ideal entre o Executivo e Legislativo é os dois caminharem juntos. Porém, a tucana, que faz parte da base aliada do prefeito Dilador Borges (PSDB), isso não significa quem um poder precisa ser subordinado ao outro.

    

“Fui vereadora que fez oposição rígida contra aquilo que não concordava, mas nunca deixei de votar a favor da administração quando interessava ao cidadão ou fosse importante para o município. Acho que conversar é muito bom”, afirmou a parlamentar.

    

Ela também acredita que o olhar feminino pode trazer um clima mais contido para o Legislativo araçatubense. Tieza se emocionou ao falar sobre o fato de ser a segunda mulher eleita presidente da Câmara de Araçatuba, pois acredita que o ambiente do poder público ainda é muito ocupado por homens.

    

“Não adianta só ficar falando. Tem que ir lá e colocar a mão na massa. A população sente a presença da mulher nas instâncias de decisão. Não somos melhores, nem piores que os homens. Somos diferentes”, afirmou a vereadora.

    

Confira a entrevista que Tieza concedeu à Folha da Região:

Como foi a articulação para obter os votos para presidente?

Ela foi difícil e muito trabalhosa, porque eu cheguei no quase “apagar das luzes”. Reconheço isso e já até expliquei as razões. A gente fez muitas reuniões. Fiz questão de falar com os 14 vereadores. Os primeiros que procurei foram aqueles que me apoiaram na eleição realizada há dois anos. Eu respeitei os dois parlamentares que tinham me falado inicialmente que já estavam fechados com o Papinha. Não fui atrás de ninguém para mudar voto. Falei, inclusive, com o Papinha. Pedi voto todas as vezes em que estive com ele. A gente foi construindo e deu certo. Arrebanhei mais votos do que era necessário. Teve uma época em que as manifestações de voto diziam que eu e o Papinha iríamos ficar empatado em sete a sete. Se fosse assim, eu ganharia, pois fui a quinta mais votada na eleição anterior (2016). É bem desgastante, tenso e intenso. Mas foi uma disputa legal. Fomos muito respeitados no Paço Municipal. Fui lá duas vezes. Tenho certeza de que o prefeito torceu para mim, como pode ter torcido para outro. O Jaime ter aberto mão de sua candidatura me fez viabilizar um maior apoio. Penso que a administração torceu muito para que ele (Jaime) continuasse como líder, o que não é o meu perfil. Já tivemos muitos embates e acredito que a gente ainda vai ter. Mas acho que ele foi muito gentil, ajudou a consolidar a minha candidatura.

    

A senhora ficou surpresa com a quantidade de votos?

Fiquei no finalzinho. Vieram mais pessoas que eu não imaginava. Fiquei bastante satisfeita. O que aconteceu lá atrás, na primeira eleição, que parecia que ia dar certo para o meu lado, mas no dia não deu, acho que ficou no coração de todo mundo e os que vieram depois estavam com esse desejo de fazer diferente dessa vez.

    

Qual a primeira medida que a senhora pretende tomar em janeiro?

Uma coisa é ser vereadora e outra é ser presidente de uma Casa que tem um orçamento razoável e uma estrutura grande, como é a Câmara de Araçatuba. Tenho alguns projetos. A estrutura dela estou começando a conhecer agora. Não significa que a gente não conhece, mas é diferente o olhar de vereadora e o olhar de presidente da câmara. Não pode ser o mesmo. Eu já estou levantando compromissos que a câmara tem em termos de pagamentos e o que está previsto para o ano que vem para a adequação do prédio. Uma coisa que eu gostaria muito é arranjar um espaço para cadeirantes na galeria. Sei que tem que ter um elevador a mais. Respeito tanto a lei, quanto a demanda das pessoas, principalmente, das com deficiência. Também é preciso fazer um levantamento do que tem de lei em cima daquilo que gostaríamos de fazer, que é aproximar mais a câmara das pessoas e ouvir mais a população. A população fala com a câmara só na cobrança. Raramente você vê sugestões. Isso que eu gostaria que fosse diferente. As pessoas virem para cá para sugerir, indicar, aperfeiçoar a ação do Legislativo. Não só a crítica pela crítica. Eu queria que as pessoas viessem mais para construir do que destruir. Sempre trazer a sugestão sempre junto com a crítica.

    

A senhora tem alguma estratégia para trazer a população para a câmara?

A gente sempre fala em dinamizar os canais que já existem. A tribuna livre é algo que vou analisar. A escola do Legislativo também. Tenho muitas amigas do PSDB Mulher, que são vereadoras e que têm várias experiências muito interessantes. Gostaria de, assim que puder, bater um papo com Diretoria Regional de Ensino. No ensino médio é que as coisas começam a ficar mais claras para as pessoas. Vamos conversar com a diretoria para ver se a gente faz uma aproximação com o currículo do Estado. Foi muito rico o nosso relacionamento na Jornada do Patrimônio Paulista. Foi muito legal a parceria com o ensino médio. Quando eu era estudante a gente tinha essas coisas. Na educação moral e cívica nós tínhamos contato com o mundo da política. De lá para cá parece que até blindaram o assunto. ‘Ah! Política e religião não se discutem!’. A gente cresceu com alguns mitos na cabeça, que acabaram dificultando essa relação.

    

Qual é o seu principal desafio?

Sempre achei que a gente faz leis demais e ações de menos. Gostaria bastante que, na minha gestão, a gente pudesse dar mais destaque ao cumprimento das leis. Já temos muitas leis boas, oportunas, necessárias e que precisam sair do papel. Nós, de uma maneira geral, somos muito criativos na hora de propor, mas não somos muito efetivos na hora de fazer. Vejo isso sempre pelo Código Brasileiro de Trânsito. Imagine a quantidade de mortes e acidentes que deixariam de acontecer se tudo o que está escrito lá fosse cumprido. Seria um paraíso. E, no entanto, não é, porque a gente idealiza muito e põe no papel, mas não cumpre. Reparo até hoje o tanto de gente falando no celular no centro, no meio do trânsito intenso. São coisas para as quais queria chamar a atenção dos vereadores, até para cuidar daquilo que eles mesmos fizeram. O que temos na legislação que favorece a administração e faça com que as pessoas cumpram sua parte? Se for multa, que a multa seja pesada para desestimular as pessoas a não cometerem infrações.

    

Qual é o relacionamento ideal entre a câmara e o Poder Executivo?

Tenho certeza que um depende do outro. Até nessa questão do cumprimento da lei. Não somos nós no Legislativo que vamos realizar essa ação. É o Executivo que faz isso. Acho que temos que ser sempre “nós e eles” e não “nós ou eles”. Quando a gente começa a fazer isso (nós ou eles) a relação passa a ser prejudicial. Não dá para não andar junto. Mas não precisa um ser subordinado ao outro. Isso não existe. Os interesses do Executivo não podem ser muito diferentes dos interesses do Legislativo. Quando não estamos legislando nós somos cidadãos e somos alvos das ações do Executivo como todo mundo. Pensando assim, acho que fica fácil entender o quanto que essa relação precisa ser boa. Isso é civilidade, cidadania e até ser cristão. Sei que é uma coisa fora da normalidade, mas que gostoso seria se pudéssemos discutir a essência de um projeto. Ter quem é contra e quem é a favor em cima disso. Fui vereadora que fez oposição rígida contra aquilo que não concordava, mas nunca deixei de votar a favor da administração quando interessava ao cidadão ou fosse importante para o município. Acho que conversar é muito bom. Vou fazer de tudo para que seja diferente. Que as nossas sessões possam ser mais ágeis, que possamos cumprir mais o Regimento Interno. Hoje, o tempo é muito precioso. Tiveram sessões em que a gente perdeu muito tempo.

    

A câmara já teve algumas prestações de contas rejeitadas pelo TCE-SP (Tribunal de Contas do Estado de São Paulo) por conta da questão dos cargos comissionados. O que a senhora pensa desse assunto?

Acho que os cargos comissionados são necessários. Em algumas ações, a gente precisa de alguém de confiança. A parte financeira é uma delas. Tem que ter, além de confiança, uma liberdade para a pessoa, um bom relacionamento para discutir, explicar e entender. Não sou contra cargos de confiança. Mas é claro que tudo tem limite. Essa Casa já teve oito assessores para cada vereador. Se lá atrás já não era bom, imagina se você admitiria isso hoje. Mas a câmara tem uma estrutura. Eu fui, na legislatura passada a São Paulo, conversar com eles (TCE-SP) sobre esses processos. Em alguns casos, acho que precisamos defender e não podemos ir cegamente cortando todas as coisas. Não dá para assumir o que é exagero. Tendo sido definido que alguma medida precisa ser tomada a gente vai seguir. Não tem sentido brigar com o TCE-SP, mas podemos discutir com eles.

    

O que a senhora acha do fato de ser a segunda mulher a ocupar a presidência da Câmara de Araçatuba?

É um motivo de muita satisfação. Eu faço parte de um movimento de mulheres na política, sou a terceira vice-presidente do PSDB Mulher no Estado e a gente tem uma militância forte em cima da presença da mulher nas instâncias de poder. Não adianta só ficar falando. Tem que ir lá e colocar a mão na massa. A população sente a presença da mulher nas instâncias de decisão. Não somos melhores, nem piores que os homens. Somos diferentes. É outro olhar sobre cada uma das demandas da comunidade e da população. Fico muito orgulhosa (pausa). Nós somos muito poucas. As mulheres sofrem muito na política porque o mundo público sempre foi dominado pela presença masculina. O jeito masculino de ser foi importante até um momento da civilização. Depois, essa coisa do ímpeto, arroubo, destemor, que é muito masculino, precisa ser mudada um pouco, caso contrário, não vamos sobreviver (pausa). Quando postei isso (a eleição para presidente) nos nossos grupos, fiquei emocionada com a manifestação das meninas, com o tanto que isso é importante para a nossa luta. A gente fala muito, mas faz muito pouco.

    

Como que o olhar feminino pode trazer um jeito novo para a gestão da câmara?

Nós somos mais pacíficas, apaziguadoras e sensíveis. Quando tem uma mulher no ambiente, os ânimos ficam mais dominados. Em jogo de futebol, quando tem mulher na arquibancada, os homens ficam mais contidos. Só pela presença de uma mulher na mesa diretora já acho que a câmara vai ser menos conturbada. Quando a mulher vê o enfrentamento de dois homens, ela pensa no pai, no filho. Eu já me contive em muitas discussões aqui por causa do meu marido. E foi melhor. Essa contenção é necessária hoje. Não podemos andar por outro caminho. Também tem a questão do tempo, que preocupa mais a mulher do que o homem. A gente faz bastante coisa ao mesmo tempo. Se temos que limpar a casa, não tem importância que estamos cozinhando, conversando, nós vamos limpar a casa. Não vou esperar. Mulher é mais observadora e detalhista. O jeito da mulher administrar é diferente.