Seminário contra a corrupção: uma aula de Brasil em vários sentidos

Seminário contra a corrupção: uma aula de Brasil em vários sentidos

27/03/2014 0 Por Tieza Vereadora

Foto: William Sant'Ana da Silva - Brasília - 19.3.14

Foto: William Sant’Ana da Silva – Brasília – 19.3.14

Antes de começar a escrever sobre o Seminário Internacional contra a Corrupção, realizado na Câmara Federal em 19 de março preciso, sob pena de não dar conta de prosseguir, dizer duas coisas: da gratidão do convite que me foi feito pelo deputado Mendes Thame; e do grande orgulho em saber que meu nome consta do “caderninho” dessa figura especialíssima da política brasileira. Chama atenção a demonstração sincera de carinho, respeito e o apreço que as grandes personalidades, que abrilhantaram os painéis de discussão, têm pelo deputado Mendes Thame, presidente do Capítulo Brasileiro do GOPAC – Organização Global de Parlamentares contra a Corrupção e coordenador do Seminário. Impressionante como ele é considerado!

Feito o desabafo e querendo que os que não foram ao Seminário tenham, no mínimo, uma noçãozinha do que lá se tratou, tomo a liberdade de transcrever alguns de meus apontamentos, fruto de uma velha mania de anotar o que as pessoas interessantes dizem.

A despeito dos vários sustos que levei, registrei, entre outros despropósitos, que 500 mil mortos continuam a receber benefícios da previdência social; que no Congresso dormitam tranquilos 388 Projetos de alto impacto contra a corrupção e que só o barulho das ruas, às vezes, consegue acordar um ou outro, apesar dos brados insistentes de poucos deputados; que 42% dos conselheiros dos TC’s (Tribunais de Contas) estão denunciados por corrupção e que alguns Tribunais, fechados, valem bem mais ao país que funcionando; que a Polícia Federal, em 2013, reduziu em 80% as suas investigações por falta de pessoal, de recursos e de condições de trabalho; que a nossa Justiça gasta 3,7% do orçamento da União (no mundo esse gasto é de 1,5%), que a média de funcionários por Vara no mundo é 10 e no Brasil 14, que o STJ brasileiro julga 100 mil casos/ano e o americano, 200 mil/ano, e que dos 80 milhões de processos que tramitam, os “recursos” representam 23%. E entre uns e outros números estarrecedores, ouvimos o desabafo de um deputado dizendo que quem prendeu o prefeito de Coari (AM) não foi a Polícia nem a Justiça mas o Fantástico (da Rede Globo), visto que havia na gaveta da Polícia e da Justiça, há muitos anos, um caminhão de acusações e suspeitas de ser ele – o prefeito – o chefe de uma rede de exploração sexual de crianças e adolescentes, além de estar envolvido em casos de pedofilia. Fatos, dados e “sapos” difíceis de engolir!

Mas, tendo em vista que este nosso espaço tem limites, sinto-me na obrigação de enaltecer algumas lutas que esses notáveis disseram que precisam ser travadas, para dar um jeito no país. Disseram eles: que os crimes de corrupção deveriam ser imprescritíveis e a reparação dos danos inalienável; que urge combater a cultura da corrupção e fazer o recrutamento de indivíduos probos, para serem os servidores “do” público, todos e sempre admitidos por mérito. Disseram eles que sumir com as empresas que se valem de práticas corruptas na aquisição de contratos. Ainda sobre os funcionários “do” público, sugeriram eles, que é imprescindível qualificar mais servidores, sobretudo os que elaboram planos e projetos envolvendo recursos públicos; e disseram que uma pesquisa recente revelou que apenas 7,6% dos mais de 12 milhões de servidores das 3 esferas de governo passaram por aprimoramento nos últimos anos e apenas 12% da governança brasileira entrou efetivamente na era digital. Afora esses absurdos, ficou evidente nas falas, que o Brasil precisa encontrar meios de separar, na Justiça, os processos que envolvem atos de corrupção de 500 milhões de reais dos que tratam do roubo de uma galinha; eles continuam juntos, na mesma pilha.  Vimos da urgência de mudar o modelo de financiamento das campanhas eleitorais e o sistema de pagamento das despesas públicas, quitando-as na ordem cronológica em que foram feitas. E a imprensa que estava presente, falou; falou da sua incalculável contribuição na denúncia de atos lesivos ao patrimônio público mas fez o mea culpa diante da premência de entrar no debate sobre as causas da corrupção e não apenas focar nos fatos e nos corruptos. E, ainda no tocante aos desafios, teve ex-ministro dizendo que o grande salto será dado quando as ações de recuperação do dinheiro tirado do erário forem imprescritíveis, até o último centavo, e o povo compreender que erário rima é com sacrário. Senadores também se apresentaram e um deles convocou os brasileiros para um pacto pelo Brasil e contra o presidencialismo imperial que aqui se instalou com os últimos governos e que tem desestimulado talentos que se afugentam assustados pela concorrência desigual em razão da utilização da máquina corrupta.

No Seminário ouvi muito mais do que ora o espaço me permite destacar. De vários palestrantes escutei que a corrupção se instala quando o Estado não tem boa estrutura e por minha conta e risco acrescento: e que ela se agiganta quando os governantes têm como propósito a manutenção dessa estrutura pervertida e putrefata, bem ao sabor de seus vorazes interesses, alguns deles até em outras terras.

E como tenho que concluir esta “extensa síntese” ouso dizer que a corrupção existe porque as estruturas são fracas; persiste porque as pessoas são falhas e só se movimentam para olhar o próprio umbigo; e se consolida porque a governança não brota com a chuva nem nasce nas árvores, surge dessa estrutura corrompida e das pessoas cujas falhas graves de caráter cedem ao primeiro aceno de vantagem. Ninguém vira corrupto; ele sempre o foi.

Mas, como nem tudo está perdido, benditas sejam as exceções; e vida longa e força, muita força para elas – as exceções!!!!


Tieza Lemos Marques

Assistente social aposentada, jornalista, radialista, vereadora pelo PSDB em Araçatuba – SP; integrante do movimento de mulheres do PSDB