25/07/2011.
O governo pôs em marcha uma operação para tentar transformar o mar de lama que se espalha por vários setores da
administração em virtude presidencial. O que é para ser pura obrigação passou a ser alardeado como qualidade rara.
Tratar com lisura o bem público e punir desmandos é o mínimo que se pode esperar de um governante.
A “faxina†que a presidente da República promete levar a fundo na área dos Transportes veio para tentar consertar os malfeitos que grassam por lá nos últimos anos, sempre sob os olhares mansos da então ministra-chefe da Casa Civil e “mãe do PACâ€. A mesma Dilma Rousseff que agora promete prender e arrebentar viu a caravana da multiplicação dos contratos passar, sem ladrar.
A estratégia de desvencilhar-se das falcatruas pretéritas e presentes começou com as demissões em série de envolvidos em escândalos denunciados pela imprensa e, na semana passada, incorporou a abertura do gabinete presidencial à imprensa – num gesto que não ocorria desde abril, data da única entrevista que a presidente concedera a jornais impressos até agora.
As entrevistas tinham um público claro: a classe média informada, que cada vez mais desaprova a forma como o governo vem agindo diante do noticiário negativo. Em uma das conversas, Dilma se confessou “noveleiraâ€, mostrou-se interessada na música brasileira e falou mais um monte de amenidades sem importância. Abriu seu coração.
Em outras entrevistas, mais sérias, ela anunciou, estrategicamente, que “sairão todos†os envolvidos em desvios e malversações no Ministério dos Transportes, no Dnit e na Valec, a estatal das ferrovias. Foi uma forma de tentar demonstrar que a situação nesses órgãos atolados em irregularidades está sob controle de sua mão de ferro. Seria ótimo se fosse verdadeiro.
Os inúmeros escândalos que a presidente enfrenta não podem ser resolvidos apenas no gogó ou mesmo por mera substituição de pessoas. O buraco é bem mais embaixo: há tempos, essas máquinas do Estado foram carcomidas pela corrupção, numa simbiose de interesses que o PT não apenas permitiu como incentivou.
O Dnit, por exemplo, funciona de maneira absolutamente caótica, escancarou O Globo em sua edição de domingo. O órgão foi definido como “uma engrenagem azeitada para impedir o controle e engavetar toda e qualquer proposta moralizadoraâ€. Planos de gestão e códigos de ética, com metas e controles rígidos elaborados pelos funcionários, foram zelosamente esquecidos num canto de armário pelo diretor-geral Luiz Antonio Pagot.
Há mais de 150 sistemas de informações diferentes na sede e nas 23 superintendências regionais do Dnit, o que impede qualquer tipo de comunicação racional entre sua gigantesca estrutura. As diretorias não conversam; os setores de projetos e licitações primam pelo desentrosamento. Como resultado, 66% dos projetos elaborados entre 2003 e 2008 tiveram como destino o arquivo morto.
Projetos malfeitos contratados junto a consultores “independentes†desembocam, naturalmente, em aditivos contratuais bilionários abocanhados por empreiteiras. Tudo muito conveniente, exceto para o contribuinte, que arca com a farra.
O Dnit trabalha, ainda, sem planejamento integrado que vise o país como um todo. Obras são autorizadas ou esquecidas ao sabor de conveniências políticas. Também no domingo, O Estado de S.Paulo informou que, das 23 superintendências do órgão, 15 apresentam problemas de corrupção, superfaturamento, fraude de licitações e tráfico de influência. Tudo dominado pelos apadrinhados do Partido da República de mãos dadas com os operadores do PT.
Nas entrevistas à imprensa no fim da semana passada, Dilma prometeu dar um jeito neste oceano de irregularidades. Deveria, antes de mais nada, explicar como, no papel de “mãe do PACâ€, deixou seus pupilos fazerem tanta lambança. Será preciso mais que simples palavras e estratégias pueris de comunicação para convencer a população. Se a sujeira era tanta, por que ela ajudou a varrê-la para debaixo do tapete?
Fonte: ITV – Carta de Formulação e Mobilização Política – nº 283