Idéias mofadas

Idéias mofadas

05/02/2012 0 Por Tieza Vereadora
Por Margrit Schmidt para Jornal de Brasília; 4 de fevereiro de 2012.
Dilma tratou de eliminar qualquer esperança de que o Brasil do PT possa estar alinhado com a defesa da democracia e dos direitos humanos

Já se foi o segundo mês de janeiro e o governo Dilma não dá pista de que tem chance de engrenar. Foram 14 meses de paralisia administrativa, eventos marqueteiros e festival de demissões de ministros por denúncias de corrupção. Chega a dar tédio ter que escrever sobre política na cena atual brasileira. Agora mesmo, na semana que passou, caiu mais um ministro. O nono a sair nestes 14 meses de governo, o sétimo por suspeitas de irregularidades. É mais uma troca de seis por meia dúzia: Mário Negroponte deixou o Ministério das Cidades, mas seu PP continuará comandando a pasta. Assumiu ontem o  líder do partido na Câmara, Aguinaldo Ribeiro, da Paraíba, que responde a ações no Supremo Tribunal Federal e indicou a cidade administrada por sua mãe para receber verbas, conforme a imprensa divulgou durante a semana. É ou não é mais do mesmo?
Até mesmo a diplomacia brasileira mostrou que é mera continuidade do governo anterior. A política externa, sob a batuta de Dilma, vinha sendo elogiada por adotar uma suposta “inflexão” da linha levada por Lula, reconhecidamente um adorador de tiranos  mundo afora. Mas a tal “inflexão” foi jogada na lata de lixo das análises apressadas dos áulicos de plantão. Não durou dois verões. Dilma Rousseff, em visita à Cuba, tratou de eliminar qualquer esperança de que o Brasil do PT possa estar alinhado com a defesa da democracia e dos direitos humanos no mundo. Uma frase da presidente Dilma Rousseff, em especial, no meio de suas desastradas declarações em Havana, deu o que falar. Além do conteúdo horripilante –  a mistura dos alhos da maior democracia do planeta com os bugalhos da decrépita  e longeva ditadura cubana –, não chegou a surpreender a formulação desconectada da frase: “Nós começaremos a falar de direitos humanos no Brasil, nos Estados Unidos, a respeito de uma base aqui chamada Guantánamo, direitos humanos em todos os lugares”. A base americana não se chama Guantánamo. Guantánamo é o nome do local onde foi construída.
Um simples detalhe, mas um detalhe que reforça a já conhecida dificuldade da presidente em completar frases com clareza e precisão. Os indicadores das ações executivas de seu governo já começam a deixar pulgas atrás da orelha, como os números do programa de construção de creches lançado com o costumeiro espalhafato no ano passado. Resultado quase zero. E vai ficando mofada no chuvoso verão do Planalto Central do Brasil a ideia de que ela é uma “gerentona eficiente”. O conteúdo da frase infeliz, a comparação entre a desconfortável mancha na história do EUA – a prisão de mais de 300 presos em Guantánamo – com a violenta e assassina ditadura dos irmãos Castro foi rejeitada por todas as pessoas com o mínimo de apreço à democracia e aos fatos.

 

Esquerdismo falho

Dilma poderia restringir-se às regras protocolares que norteiam as visitas de chefes de Estado aos países que desrespeitam os direitos humanos. Poderia ter se esquivado da pergunta incômoda sobre as prisões políticas, as torturas, e as seguidas mortes de dissidentes.  Há dúzias de respostas prontas nas prateleiras da diplomacia para jogar cortinas de fumaça nos olhos da plateia. Mas a esquerda é a esquerda e, como lembrou alguém um dia desses, o escorpião ferroou o sapo que lhe atravessou até a outra margem do rio. Quando o sapo, à beira da morte, envenenado pela ferroada, lhe perguntou por que foi ferroado depois de ter salvado sua vida, recebeu a resposta: ‘Desculpe, é a minha natureza’. Ninguém consegue mudar a natureza do outro, conta a moral da pequena fábula.
Assim, mais uma vez, a presidente do Brasil preferiu honrar a sua natureza esquerdista que defende os horrores de regimes autoritários desde que em nome da “causa socialista”, do que os direitos humanos, estes sim, uma conquista do que há de mais civilizado em nós. Fingir que Cuba não continua a ser uma ditadura violenta é apenas a banalização do mal em nome da “causa”, vencida pelo tempo histórico, diga-se. Aliás, relativizar a narrativa histórica é sempre um perigo, pois é desse modo que os defensores nazis propõem “explicações” das “razões” de  Hitler fazer  o que fez com judeus, ciganos, homossexuais e artistas. O jornal Folha de S. Paulo fez uma campanha publicitária nos anos 80, em que “avanços” promovidos pelo nazismo rolavam em uma lista na tela, enquanto entrava em foco a imagem de Hitler. “É possível contar um monte de mentiras dizendo só a verdade”, dizia a propaganda.