Confronto esperado
25/01/2012O Estado de S. Paulo, 24 de janeiro de 2012 | 3h 10
A desocupação de uma área de 1,3 milhão de metros quadrados em São José dos Campos, determinada pela Justiça estadual e realizada na manhã de domingo pelo Batalhão de Choque da Polícia Militar (PM), seguiu rigorosamente o roteiro elaborado pelos movimentos sociais para ganhar as manchetes dos jornais e obter visibilidade política. Conhecida como Pinheirinho, a área pertence à massa falida da empresa Selecta, do Grupo Naji Nahas. Invadida em 2004, ela se converteu numa comunidade controlada pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), cujos líderes diziam viver lá cerca de 1,5 mil famílias, num total de 6 mil pessoas.
Para dificultar o acesso ao local, os invasores ergueram barricadas com paus, que depois incendiaram, e colocaram idosos, grávidas e crianças na primeira linha de resistência. Por sua vez, a PM empregou na operação um blindado, além de 220 viaturas, 100 cavalos, 40 cães e 2 helicópteros, dando aos movimentos sociais pretexto para veicular pela internet notas de protesto descrevendo a operação de reintegração de posse como um “massacre” de pobres e desabrigados, que teria deixado “mortes” e um “rastro de destruição”.
Os invasores atiraram pedras contra policiais, incendiaram uma escola pública, uma biblioteca e oito veículos – entre eles dois carros de reportagem – e ainda tentaram impedir o tráfego na Via Dutra, o que obrigou a PM a intervir novamente. Na madrugada de segunda-feira, alguns manifestantes tentaram jogar um coquetel molotov num depósito de gás e num posto de saúde.
Terminado o embate – que resultou em 1 homem ferido à bala, 8 manifestantes com escoriações e 18 pessoas presas, acusadas de vandalismo – os líderes do MTST passaram a acusar a PM de ter exorbitado. Também criticaram o governador Geraldo Alckmin com o coro de sempre. Dirigentes da OAB, por exemplo, afirmaram que a ordem para a reintegração de posse expedida pela Justiça estadual foi ilegal. O advogado dos invasores, Antonio Ferreira, foi baleado na virilha, no joelho e nas costas com balas de borracha. E o senador Eduardo Suplicy alegou ter ficado “surpreso” com a operação. “A cada telefonema que recebo, ouço relatos de abusos por parte da polícia, jogando bombas”, disse ele.
O comando da PM, no entanto, anunciou que a operação foi inteiramente gravada, alegou que o “fator surpresa” foi crucial para a desocupação da área, afirmou que os moradores não ofereceram resistência e responsabilizou militantes de pequenos partidos da esquerda radical – que nem mesmo moram na área invadida – pelo entrevero. Uma semana antes, vários invasores e militantes posaram para cinegrafistas e fotógrafos equipados com capacetes de motociclistas, porretes, escudos de latão e canos de PVC – além de máscaras, para não serem identificados.
Por trás desse lamentável episódio, estão dois partidos que há muito tempo se digladiam para tentar desalojar o PSDB das principais prefeituras do Vale do Paraíba, região onde Alckmin iniciou sua carreira política. Um deles é o PT. Não foi por acaso que, entre as pessoas feridas com escoriações, uma se apresentou como assessor da Presidência da República. Sob o pretexto de intermediar uma solução pacífica, políticos petistas da região acenaram com a possibilidade de o governo federal ajudar na desapropriação da área, financiando um programa habitacional. O outro partido é o PSTU, que prega a substituição do Estado capitalista pelo ” marxismo revolucionário”.
Sem qualquer relevância no plano eleitoral, o PSTU é atuante nos meios sindicais, exercendo influência entre os metalúrgicos e os químicos no Vale do Paraíba, uma das regiões mais industrializadas do País. A exemplo do que ocorreu com o PT, em seus primórdios, o PSTU tem o apoio de movimentos sociais que se especializaram em invadir propriedades particulares para obter na mídia um espaço desproporcional à sua representatividade política. O confronto em São José dos Campos, iniciado com o descumprimento de uma ordem judicial, faz parte dessa estratégia.